terça-feira, 20 de novembro de 2012

Minhas queridas amigas de trabalho : A Bolsa de Estudo

  
   Alexicleide recebeu a feliz notícia de ter sido  selecionada, após um acirrada concorrência entre milhares de pessoas altamente capacitadas, para uma bolsa de estudo paga integralmente pela  sua empresa. Uma bolsa de Inglês ; bem, essa era a proposta inicial: Inglês. 
   Alex chegou em casa berrando : "ganhei uma bolsa de estudo", "ganhei uma bolsa de estudo". Sua empregada doméstica Nanivilma atenta a qualquer novidade parou de lavar os pratos e correu para sala gritando mais alto que sua patroa: "que bom Dona Alexcleidinha, que bom Dona Alexcleidinha que a senhora ganhou uma bolza de estudu para galrregar sua cosias". Alexcleide com sua costumeira paciência rebateu na hora: "deixa de doidice menina, não é bolsa de carregar coisas, a empresa vai pagar o meu curso de inglês, tudinho, tudinho, de grátis". Sua secretaria não entendeu o que bolsa e empresa tinha a ver com estudo e fez mais perguntas descabidas; dessa vez a premiada pela bolsa não teve mais paciência e a dispensou rapidamente de volta para o seu habitat natural, a cozinha. Nani voltou mais continuou com a orelha espichada, atenta a conversa na sala.
  Seus dois filhos, sem muito entender, mas participando da agitação familiar, também  adentraram na sala felizes, parabenizando-a e gritando, "parabéns mamãe, parabéns mamãe, graças a Deus que a senhora conseguiu uma bolsa para carregar livros de Inglês". A mãe corrigiu, docemente : "não é bolsa para carregar livros de inglês meus queridos, é um curso de inglês grátis que eu ganhei" , os meninos gritaram "que bom que agora a senhora vai apreender a falar a língua do Mickey, Pato Donald, Pluto, Tio Patinhas...." . As crianças choravam de emoção imaginando já na Disneylândia e nos braços dos personagens Disney. Enfim, foi uma revolução doméstica.
   Alexcleide preparou-se para o primeiro dia de aula: comprou roupas novas numa loja ao lado  de um famoso mercado do centro da cidade, espichou o cabelo num cabeleireiro também ao lado desse mercado, fez depilação num local obscuro, também nas redondezas, indicado pela sua amiga de trabalho Camélia, e para completar comprou um óculos Ray-Ban num shopping center recem inaugurado na zona sul  da cidade; Enfim, fez uma grande mudança no seu layout, providência mais que necessária visto que  o curso de Inglês, para o qual havia sido selecionada, chamado DRAZIW, é ou era (ou quem sabe jamais foi..), um dos mais reconhecidos da cidade, pelo menos da região central da cidade;  executivos de multinacionais, diretores e gerentes de grandes empresas,  eram seus clientes, e os vários anúncios nas rádios e jornais já alardeavam a eficácia do dito curso.
 Chegou o primeiro dia de aula  Alexcleidinha apareceu deslumbrante no curso, a bordo do seu carro preto e importado (chinês), comprado recentemente e zerinho em folha. Entrou na sala de recepção e ficou muito encantada: a atendente era linda e loira,  parecia inteligente também. Havia várias pessoas fazendo suas inscrições:  homens de paletó,  mulheres elegantes e chamosas, provavelmente executivos e pessoas importantes nos seus ramos de negócios, tudo muito organizado e profissional.  Alexcleide imaginou que todas essas pessoas eram realmente futuros alunos e não uma jogada de marketing feita por empresas de fundo de quintal para chamar a atenção dos alunos novatos, inocentes e incautos. O ambiente a deixou plenamente confiante no sucesso da sua empreitada.   
  Chegou na sala de aula, ansiosa e um pouco nervosa, afinal de contas era um curso de altíssimo nível (ficava no quinto andar de um prédio  elegante ao lado do já falado mercado) com professores capacitados nas melhores escolas de inglês do país (pelo menos isso foi o que ela leu num folder achado na calçado do prédio onde trabalha).
  Ao entrar na sala ficou chocada de cara, pois tinhas apenas três alunos e nenhuma daquelas pessoas charmosas e de paletó que apareceram na sala de recepção. Resolveu investir rapidamente na língua de Willian Shakespeare, procurando já de cara chamar atenção, deixando sua marca, mostrando todo o seu potencial; lascou um "good morning" bem alto e sonoro; o professor, respondeu, "Bom dia" ; ela repetiu "Good morning" e ele respondeu novamente  "bom dia", e o fato se repetiu durante 15 segundos. Não tendo sucesso na apresentação ela desistiou e  achou muito estranho a resposta dele na língua de Camões, ficou quietinha e sentou no seu cantinho da sala aguardando o início do curso. O professor, um senhor de mais ou menos 60 anos, com uma aparência  daqueles portugueses  bronzeados do Mediterrâneo,  usou a língua portuguesa durante todos os 10 minutos da primeira parte da aula (isso também era muito esquisito pois no contrato era dito que o curso tinha 1 hora e meia de aula), descrevendo muito bem concordância nominal e verbal, crases, colocação pronominal, etc,  etc ; enfim, nada de Inglês. 
Na segunda parte da aula, nos 10 minutos restantes, a situação piorou ; o teacher pegou o giz e colocou no quadro negro (não existia caneta e quadro branco na sala por recomendação do professor que alegava que esses recursos eram invenções capitalistas) a seguinte sequência de palavras: "one, dois, three, quatro, five, seis, seven, oito, nine e finalmente dez". Alex quase cai de costa, não entendeu nada e perguntou: "Sorryyyyyy professor, porque alguns números estão em inglês e outros em português ?. O teacher prontamente devolveu a pergunta com outra: "você sabia que nosso cérebro guarda no lado esquerdo as informações da sua língua corrente e no direito informações da língua que está aprendendo ? Eu quero apenas misturar os dois lados para que no final da aula os lados saibam as duas línguas" Alex, deu um pequeno suspiro e a partir daí teve dúvidas da sanidade do professor e se realmente conseguiria aprender o idioma dos personagens Disney.    
  Não tendo mais opções aproveitou sua ida ao banheiro e foi  à recepção perguntar se havia trocado de sala, se aquilo era realmente uma aula de inglês ou qualquer coisa semelhante. A atendente falou que não, que aquela era  realmente  uma aula de Inglês, porém utilizando um método revolucionário  onde o aluno era obrigado primeiro a aprender português, depois inverter os lados do cérebro com as duas línguas e finalmente depois de 2 meses falar fluentemente o inglês. Nossa amiga, muito decepcionada, com essa explicação tresloucada, e já temendo pela sua "bolza de estudu", resolveu voltar para a sala e acompanhar sua aula de português/inglês. Ao termino de sofridos 20 minutos  de aula,  com muito respeito,  deu um "bom dia" se despedindo do professor, este respondeu com um "good morning", ela repetiu "bom dia", ele "good morning"; Depois de muita insistência sem sucesso ela desistiu e retirou-se da sala , dando um último bom dia já aos berros, perdendo toda a classe, "good diaaaaaaaaaaaaaaaaaaa POR$%AAAAAA" e saiu correndo já imaginando como seria o próximo dia. 
  Não teve próximo dia: ao chegar em casa a primeira pessoa que ela encontrou foi Naninaval, a espera da patroa, aguardando novidades a respeito do curso, e já com uma pergunta a ser feita, uma pergunta iluminada e infeliz: "Diga lá dona Alexcleidinha já dar para falar com o Pato Donald ?". cleidinha sem a mínima paciência, completamente transtornada com o método revolucionário do DRAZIW, berrou: "chispaaaa daqui mulher senão  te mando falar  não com o Pato Donald mas sim com o PLUTO OU MELHOR A PLUTA QUE TE P*&¨%".
  Soube-se depois, pela rádio corredor da empresa onde trabalhava, que a jovem pretendente a falar inglês não estava presente no segundo dia de curso nem tampouco nos demais;  foi vista um tempo depois rondando sorrateiramente um famoso "sebo" da cidade, vendendo seu precioso livro de Inglês e comprando uma cartilha básica de português, segundo dizem para presentear sua secretaria doméstica e fazê-la aprender a falar "bolsa de estudo".............